domingo, 23 de outubro de 2011

Ocupym Wall Street. O Que a Arte tem Haver com Isso?



Por Ednaldo Britto

No dia 17 de setembro, pelo menos duas mil pessoas ocuparam o centro financeiro de Wall Street em Nova Yorque nos Estados Unidos, o que deu início ao “Ocupym Wall Street” movimento contrário as medidas tomadas pelo Sistema Financeiro Internacional em relação à crise econômica mundial. Diante deste fato, que aponta para uma mudança cultural no cenário americano, não podemos deixar de nos perguntarmos: O que a arte tem haver com isso?

Não é de hoje que alguns intelectuais vêm chamando atenção para a excessiva mercantilização do sistema das artes. Em muitas publicações recentes lemos coisas como: “Antigamente a posse de uma obra de arte dava respeitabilidade ao dinheiro dos muito ricos; hoje é o dinheiro dos muito ricos que dá respeitabilidade à obra de arte. Os valores inverteram-se: o dinheiro servia à arte, hoje a arte serve ao dinheiro” ou “Não se pode entender a ‘arte contemporânea’ sem passar pela livraria e pela bolsa de valores”. Estas observações feitas pelo jornalista Luciano Trigo e pelo escritor Affonso Romano de Sant’anna, respectivamente, coincidem com as críticas que estão sendo feitas também no campo da educação, das pesquisas científicas e, curiosamente, no campo religioso, sobre as influências do mercado financeiro no cenário mundial.

Em 2006, foi publicado no Brasil o livro 'Privatização da Cultura: a intervenção corporativa nas artes desde os anos 80' da pesquisadora Chin-tao Wu, especialista em arte e cultura contemporânea integrada a Universidade College da Inglaterra. Em seu livro Wu observa: “(...) a influência empresarial é hoje muito grande em todas as fases da arte contemporânea – produção, disseminação e recepção”. Ainda no texto de apresentação do livro de Chin-tao Wu, Danilo Santos de Miranda ressalta “(...) a banalização dos produtos culturais e artísticos, tornados tão evidentes pelas indústrias culturais da sociedade de massas, parece emergir de modo diferenciado na era da globalização. As novas estratégias de difusão em escala planetária têm atuado de modo que atenda às características mais específicas dos mercados”.

Portanto, embora saibamos que as relações dos artistas contemporâneos com o capital financeiro atual sejam bastante diferentes do comportamento anti-burguês dos artistas do final do século XIX, não podemos deixar de observar com certa preocupação que a arte contemporânea, mantendo-se na trajetória da total assimilação pelo mercado ou pelas instituições estatais, corre um sério risco de ser transformada em mero entretenimento sem qualquer significado cultural mais relevante. Sendo assim, cabe avaliarmos até que ponto a tão propalada autonomia da arte se mantém como algo concreto na contemporaneidade, ou se já não passa de uma velha convicção modernista inviabilizada pela atual relação entre arte e mercado.


Referências

Cauquelin, Anne. Arte Contemporânea: Uma Introdução. São Paulo: Martins, 2005.
SANT’ANNA, Affonso Romano. Desconstruir Duchamp: Arte na hora da revisão. Rio de Janeiro: Vieira & Lent, 2003.
SMIERS, Joost. Artes Sob Pressão: Promovendo a diversidade cultural na era da globalização. São Paulo: Escrituras, 2006.
TRIGO, Luciano. A Grande Feira: uma reação ao vale-tudo na arte contemporânea. Rio de Janeiro: Record, 2009.
TAYLOR, Roger L. Arte, Inimiga do Povo. São Paulo: Conrad Editora, 2005.
VISENTINI, Paulo G. Fagundes & Pereira, Analúcia Danilevicz. História do Mundo Contemporâneo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.
WU, Chin-tao. Privatização da Cultura: a intervenção corporativa nas artes desde os anos 80. São Paulo: Boitempo, 2006.

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